segunda-feira, 21 de maio de 2012

Retomar a construção interrompida ( Carta Capital )

21.05.2012 11:00

Foto: Samuel Lorenzetti

A Rede D é um grupo em formação que pretende pensar e colocar em prática “um projeto nacional desenvolvimentista”, com definiu Carlos Lessa. 

Governar um processo aparentemente ingovernável. Esta é a questão de fundo sobre a qual se debruça desde novembro passado a Rede D, um grupo em formação que reúne algumas dezenas de especialistas em desenvolvimento. Em comum, a decisão de pensar e colocar em prática “um projeto nacional desenvolvimentista”, como disse o economista carioca Carlos Lessa no evento de lançamento, com foco na reindustrialização.
Uma árdua tarefa, reconhecem os participantes ao listar as algumas das encrencas postas na mesa: resistências ideológicas e políticas nas universidades, governos e mídia, assim como os poderosos interesses instalados, a começar pelo sistema financeiro nacional e sua histórica aversão ao risco. E, no momento, a difícil tarefa de manter o prumo em meio ao remoinho da crise financeira internacional, a embaralhar todas as cartas, e o fantasma da “primarização” irrevogável da economia brasileira, alimentado pelo boom da soja e do minério de ferro.
Reunidos em Campinas entre os dias 8 e 10 de maio, enfrentaram uma pauta ampla e complexa no seminário “Desenvolvimento e Crise Global: impactos no Brasil e na América Latina”. A maioria dos cerca de 50 experts presentes formada por economistas, alguns sociólogos, cientistas políticos e diplomatas, unidos pela crítica radical à ortodoxia neoclássica. Filiados muitos deles às escolas de economia da Unicamp e UFRJ, alguns desgarrados da FGV-SP e USP, vários de instituições do Estado, como o Itamaraty e o Ipea, e apoio financeiro do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), uma organização social ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia. E especialistas da Cepal, o centro de pesquisas latino-americano da ONU sediado no Chile, cuja história está intimamente ligada ao paradigma desenvolvimentista que esgrimam e pretendem ver hegemônicos no País. (A FGV do Rio não foi convidada, muito menos a PUC carioca, ambas inimigas declaradas, apontadas como o “outro” a ser esconjurado, na academia, nos jornais e TVs, enfim mundo afora.)
Um projeto com gás, devido ao crescimento recente da economia brasileira, com distribuição de renda e dólares garantidos pela exportação de commodities. Acossado, contudo, pela nova configuração do capitalismo internacional e a divisão do trabalho dele resultante, com a imbatível concorrência chinesa a se firmar como a “fábrica que restou no planeta”.
O grau zero desse imbróglio localiza-se na voracidade da finança internacional desregulamentada, surgida nos anos 1970 e início dos 80 nos EUA, que resultou em uma montanha de dólares e euros mundo afora, ávidos por bolhas especulativas, segundo comentou o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, consultor editorial de CartaCapital. “O fato mais importante dos últimos 30 anos foi o mercado financeiro norte-americano ter atraído fundos da Europa”, afirmou Belluzzo. “Foram esses fluxos de capitais que permitiram aos EUA manter as taxas de juros baixas, o que gerou a primeira bolha (ligada à internet), depois a segunda, no mercado imobiliário, e finalmente esse boom de consumo que observamos. O sentido de determinação é este: do crédito das finanças nos EUA para o gasto norte-americano. Do gasto norte-americano para a geração de déficits (nos EUA). Do déficit para a acumulação de reservas na China. E do gasto da China para o afrouxamento das restrições de balança de pagamentos no Brasil.”
Aí a origem da relativa bonança atual do País, com desemprego baixo e o crescimento acumulado nos últimos anos, com reservas de quase 400 bilhões de dólares. A despeito da barbeiragem eminentemente ortodoxa do BC de Henrique Meirelles, que aumentou os juros logo após o estouro da crise em setembro de 2008, “um erro inacreditável”, segundo a cartilha da Rede D.
Na direção desejada agiu o Ministério da Fazenda de Guido Mantega, ao usar os bancos públicos para contrapor-se à seca de crédito de 2009. E a partir dos bons resultados colhidos, inflar os ânimos das hostes heterodoxas. A eleição de Dilma Rousseff e a escolha de Alexandre Tombini para o BC deram novo alento, que agora os especialistas filiados à “escola campineira” de pensamento econômico, com o argentino Raúl Prebisch e o brasileiro Celso Furtado como patronos, buscam fortalecer.
Professor da UFRJ, Ricardo Bielschowsky chamou atenção para o fato de que as experiências desenvolvimentistas anteriores do País, no período de Getúlio Vargas e na década de 1970, souberam reconhecer as oportunidades. “Agora é a mesma coisa”, diz o economista, “existem no momento três frentes de expansão potencialmente poderosas. São três motores do investimento que estão colocados à nossa frente neste momento: aqueles movidos pelo crescimento com distribuição de renda e foco no consumo de massas, os investimentos em serviços sociais e em atividades baseadas em recursos naturais.”
O desejável, contudo, é ir além. E “governar esse processo”, diz Bielschowsky, de modo a criar uma estratégia de crescimento que renda benefícios à maioria. “A construção de um mercado de consumo de massas já surgiu. A explosão do consumo chinês por alimentos e energia, também. E há uma recuperação do investimento governamental, a começar pela Petrobras. Fica faltando a inovação, que não é uma frente em si mesma, mas é algo transversal, capaz de turbinar esses vetores.”
Ricardo Carneiro, professor do Instituto de Economia da Unicamp e coordenador da Rede D, considera que é relevante atentar para a centralidade do Estado nessa trajetória a ser esboçada. “O que move o capitalismo periférico? Certamente não são as mesmas forças que movem o capitalismo central. No caso brasileiro, boa parcela de todo o debate sobre o desenvolvimentismo tinha a ver com superar o desenvolvimento comandado pela demanda externa. É essa a reflexão de Prebisch e Furtado. Eles fizeram um grande esforço para internalizar os fatores dinâmicos do capitalismo. De um certo ponto de vista, esse pode ser o nosso debate novamente. No caso dos capitalismos avançados, é possível pensar nessa forma dinâmica que podemos chamar de desenvolvimento autônomo, o progresso técnico combinado à capacidade de financiamento. Mas no caso da periferia não dá para fazer sem o Estado. Precisamos aprender essa lição.”
Entre os dois polos de desenvolvimento bem sucedidos que se colocam, o chinês e o norte-americano, surge como consenso entre os participantes da rede que nenhuma das opções poderá ser adotada pelo Brasil. “Nem China, nem EUA”, diz Carneiro. “O modelo norte-americano é o do consumo, que supõe renda média alta e instituições capazes de financiar o consumo. É um país que conseguiu crescer nos últimos 20 anos em cima da demanda ampliada pelo crédito. E não podemos ter o padrão chinês, cujo crescimento se deu com base na produção de manufaturas em cima de salários de fome. Depois de 30 anos de crescimento, o salário industrial na China é hoje de 1,1 dólar por hora. No Brasil, um País relativamente pobre, é de 5,3 dólares por hora, cinco vezes mais.”
O “modelo brasileiro” teria de seguir a combinação de três elementos fundamentais, avalia o economista, ecoando o pensamento dos demais participantes do seminário. “Primeiro, precisamos de muito mais mercado interno do que externo. E temos duas grandes frentes de expansão, a distribuição da renda, que pode melhorar bastante, ainda que não se trate de uma força autônoma, mas de algo que aumenta a multiplicação do crescimento. E temos um campo vastíssimo que é a infraestrutura. A infraestrutura brasileira é absolutamente inadequada, defasada. E temos a terceira frente, dos recursos naturais, que vão resolver problemas de divisas e um conjunto de questões que podem ser restritivas ao crescimento.”
Ex-embaixador do Chile no Brasil, o economista Álvaro Diaz, hoje pesquisador-sênior da Cepal lotado em Brasília, considera ainda que o Brasil terá ainda de encarar a herança do período de inflação alta. “As regulações do mercado financeiro foram herdadas de décadas, como no caso da caderneta de poupança, e têm de ser desmontadas. Aí existe uma intensa economia política por trás disso. A construção de coalizões para construir um Estado que se reforme e que possa impulsionar o desenvolvimento é uma questão central. Por exemplo: na América Latina existem 10 países onde a carga tributária é inferior a 15% do PIB. O PIB tem 10%. Como fazer uma política desenvolvimentista com uma carga tributária de 10%? Não dá, isso requer um novo pacto fiscal, o que me parece ter sido uma das contribuições da Cepal nos últimos anos. Esse problema precisa estar no centro das nossas reflexões.”

Produzir no Brasil com urgência.

Tenho este tempo refletido sobre a necessidade premente de se criar a mentalidade de "produzir no Brasil", como uma campanha de conscientização. Talvez tenha sido a negação desta premissa básica, a de se produzir no país, que nos levou à bancarrota, pois não há termo melhor para definir a nossa situação perante ao FMI e os nossos três "default", na época em plena empolgação neo-liberal. Encomendamos plataformas de petróleo, navios, e toda a sorte de bens de capital que podiam perfeitamente ser aqui produzidas. Não havia a premissa política no Estado de se encomendar preferencialmente o produto nacional; que dirá de se estimular o seu projeto e desenvolvimento. Não se gerava mercado interno, logo não havia interesse.
      Realmente os tempos mudaram, mas ainda existem situações que devem ser corrigidos, herança de tempos irresponsáveis. Se não, vejamos os casos concretos.
       A VALE deve ao fisco, ou seja ao Estado, uma quantia simples de trinta e tantos bilhões. Vai ficar por isso mesmo? Lembremo-nos que o Estado tem o recurso da golden-sahre.
      O etanol, concentrada a produção  na mão de poucos, inclusive multinacionais, compromete a política de energia. Há pouco ouvimos a notícia de importação; custa crer que seja realidade. Urge a criação de um organismo, ou empresa, que discipline esta situação mais do que ridícula. Deixada a solução na mão do Ministério da Agricultura sofrerá influência dos pecuaristas e outros que não abrem mão de nada. Deixada à cargo do Ministério de Minas e Energia, se diluirá em meio a interesses maiores da distribuição e produção elétrica. E por final, a obrigatoriedade de compra de produtos de petróleo e o álcool por distribuidores, elimina a possibilidade da compra no pequeno produtor.  O financiamento pelos agentes de governo de uma mini-usina de álcool sairia mais barato que a ridícula importação do produto, além de desenvolver os fabricantes nacionais desta usinas. 
     A importação de automóveis do México, ou de qualquer outro país, já a chega ser também ridícula.
   A encomenda de importados pelas administrações estaduais, estão fora de controle. Vejo casos gritantes no Estado do Rio de Janeiro.
     Ou tomamos a decisão soberana e responsável de proteger e incentivar a produção nacional ou, não demora muito, estaremos fazendo companhia a Grécia e demais estados altamente dependentes da industrialização alheia, pois não foram somente os empréstimos que levaram a esta situação, foi o consumo desordenado e a opção pelo estrangeiro.
      A tarefa do governo urgente, juntamente com que as que estão em curso, é estancar, por um lado, estancar a saída de recursos ( além de pagamento de juros, inclua-se aí turismo e serviços ) e, por outro,  a preferência formal pelo nacional, tal como foi feito com alteração da famigerada Lei 866, herança de tempos da "big-house", ( casa-grande soa mal aos ouvidos sensíveis dos rentistas e outros frouxos ). Aliás, a Presidenta sabe muito bem onde estão entocados os inimigos do Brasil. Cabe agora planejar um combate mais duro, tal como fez e fará com os juros. A faxina torna-se urgente.