terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Memórias musicais

Tenho escrito sobre política ultimamente, justamente por sentir a clara intenção dos ataques ao Estado Brasileiro; efetuado por alguns nacionais, mas notoriamente comandados desde fora por instituições privadas e estatais. Não resta mais dúvidas, a quem tenha um mínimo de percepção e que não tenha uma razoável ingenuidade, que o ataque se faz através da colimação dos alvos relacionados ao petróleo. Deixou de ser oculta manobra, para claramente expor os agentes e contendores.

Mas, como para mim e para quem não seja tão ingênuo, passou a ser o óbvio, sinto um distanciamento do tema; não porque não  queira manifestar repulsa e vontade de combater esta agressão expressa, clara e virulenta, mas porque  este espaço quero que tenha amplitude maior e quero também trazer temas que margeiam o tema central que é enfim a nacionalidade. 

E hoje me motivou muito ouvir o "Frevo" de Claudio Santoro, obra grandiosa, complexa, mas acima de tudo, profundamente brasileira. Frevo mesmo, mas ligado com Gershwin, com Aaron Copland no "Apalachian springs". Fantástica música que me levou aos tempos da Rádio Nacional, quando Claudio Santoro me guiava na brasilidade. Ao pé do rádio, ouvia a vasta musicalidade deste, inclusive nas suas incursões na música popular. Esta também me enchendo o espírito de alegria, quando ouvia Marlene, Emilinha Borba, Rogéria, Carmélia Alves, as irmãs Batista, Dircinha e Linda. Me intrigava Albertinho Fortuna, nome de fortuna. Devia ser muito rico.

Mas um dia lá por 1952 apareceu um tal de Camargo Guarnieri e tocou "Dança Brasileira". Daí em diante o mundo nunca mais foi o mesmo. Tinha definitivamente enfeitiçado minha alma. Naquela enxurrada em diante vieram Villa Lobos, Lourenço Fernandes, Alexandre Levy, Guerra Peixe, Alberto Nepomuceno, Frutuoso Viana, até chegar a me apaixonar pela voz de Violeta Coelho Neto de Freitas e Stellinha Egg de quem fui namorado dos nove anos até nove anos e meio, uma eternidade na época, amor verdadeiro. Até que um dia ela vai cantar lá na Escola Uruguay, convidada da nossa professora de Música Da. Arminda Villa Lobos. Eu cursava a terceira série do primário e eu a ouvi cantar o "Boi Barroso", "Lamento Negro", "Terra Seca". Linda apresentação mas...ela traz seu marido, o Maestro Gaya. Fim do romance.  Entretanto aquela dor logo logo foi esquecida quando, em maio de 1954, veio à Escola, convidado pela Da. Eulina Nazareth, que era filha de Ernesto Nazareth, o próprio Villa Lobos, em carne e osso. Ensaiou as crianças no "Canto do Pajé". Aí eu já não era mais criança, virei deus. Lembro da letra até hoje e Betânia já cantou também:

Oh, manhã de sol, anhangá fugiu
Anhangá ê, ê
Ah,  foi você quem me fez sonhar
Para chorar a minha terra

Guaraci, ê ê
Anhangá fugiu
Oh manhã de sol
Anhangá fugiu
Canta voz do rio
Canta voz do mar
Tudo sonhar
O céu, o mar, o campo, as flores
Oh manhã de sol
Anhangá fugiu

Oh Tupã, deus do Brasil.
Que o céu enche de sol
De estrelas, de luar e de esperança
Oh Tupã tira de mim essa saudade
Anhangá me fez sonhar
Com a terra que perdi

Até que em 1987 conheci alguém que dividiu comigo a minha divina paixão, já que enquanto eu ficava ao pé do rádio ela saía do trabalho correndo para o auditório da Rádio Nacional. Conheceu Stellinha pessoalmente, conheceu Ercole Varetto, Lyrio Panicalli, Radamés Gnatalli, Emilinha e Marlene.
Um dia resolvemos cantar nossa alegria última. Não importava a platéia, não importava mais o tempo, pois era o último tempo.
Pena que passou, memórias.
Já não canto no café da manhã mais as canções de Radamés, de Humberto Teixeira...Elizabeth já não está mais aí para ouvir e cantar. 
A alegria da manhã dá lugar a lembranças, belas lembranças...

Oh, manhã de sol, anhangá fugiu
Anhangá ê, ê
Ah,  foi você quem me fez sonhar
Para chorar a minha terra.
"Zu meinem Land zu weinen"




Um comentário:

  1. Muito bom lembrar desses momentos musicais. Eram manhãs tranquilas, preguiçosas, que duravam até quase a hora do almoço. Aprendi com ela a gostar de Altemar Dutra, Dolores Duran e Maysa.Bom saber que pudemos curtir isso. Tenho certeza de que mamãe amou o Zezé na mesma medida que implicava com ele.

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